Uma iniciativa em marcha
O Movimento Ciência Portugal surge num momento difícil da vida nacional e é bem-vindo. Apresenta-se como “um movimento espontâneo e apartidário” que entende que “a investigação científica é um motor de desenvolvimento económico e social do país” e que importa trazer “para a primeira linha do debate político nacional o papel da Ciência e Tecnologia no desenvolvimento económico e social do país”.
Os promotores afirmam ser sua “convicção que uma política estruturada de ciência é fundamental para garantir a competitividade das instituições científicas nacionais e assegurar a solidez e continuidade do investimento em recursos humanos altamente qualificados.”
Consideram que a ciência deve “constituir um desígnio nacional suprapartidário e uma área de investimento prioritário baseado numa estratégia a longo prazo claramente definida”. Sublinham que comunidade científica nacional quer ser parte activa “da mudança qualitativa de que necessitamos no nosso país”.
O Movimento lança um manifesto ─ “Ciência – Fonte de ideias para Portugal” ─ que recolheu já mais de 2500 assinaturas de subscritores ligados a várias áreas científicas e exercendo a sua actividade em diferentes regiões do País e no estrangeiro. No Manifesto são enunciados sete princípios ou questões à volta dos quais a comunidade dos subscritores mostra existir um consenso alargado. Assim, defendem que:
- A investigação fundamental é a base de sustentação de qualquer área de aplicação, por ser essencial à criação de ideias inovadoras e dos recursos humanos capazes de gerar valor económico, a curto e longo prazo. Como tal, deve ser apoiada de forma contínua e sustentada.
- A promoção de uma cultura de excelência consegue-se apostando no mérito: nas melhores equipas, nas melhores instituições e nos melhores projectos, avaliando os resultados por objectivos e com grande exigência, e tirando consequências da avaliação. A excelência gera excelência.
- O desenvolvimento científico e tecnológico do País não é compatível com estratégias de curto prazo – exige uma visão de longo termo envolvendo as várias forças políticas e objectivos concretos, indispensáveis a uma avaliação objectiva da sua implementação e das mais-valias que trouxerem ao país.
- A gestão da ciência e tecnologia em Portugal tem que obedecer aos mesmos critérios de excelência e eficiência exigidos aos cientistas, nomeadamente na execução financeira transparente, atempada e desburocratizada, e na concretização de objectivos que deverão ser alvo de avaliação externa. Não é possível a programação de actividades de I&D num quadro de imprevisibilidade de financiamento e de crescente burocratização.
- A nossa sociedade está cada vez mais dependente de actividades de cariz tecnológico, seja na gestão de recursos naturais, nos desafios energéticos ou na resposta a problemas de saúde pública, entre outros. Estas actividades necessitam de financiamento próprio, articulado com os respectivos ministérios da tutela e com autoridades e empresas locais. Não devemos continuar a confundir, no plano orçamental, as actividades de carácter tecnológico com investigação científica.
- Para que Portugal possa aumentar a sua competitividade necessita de envolver os seus melhores cientistas e de atrair excelentes investigadores do estrangeiro, sendo para tal indispensável definir carreiras científicas estáveis e competitivas a nível internacional.
Um olhar rápido sobre a lista de subscritores, permite afirmar que, salvo melhor opinião ou análise mais cuidada, há uma larga maioria de investigadores activos em áreas que genericamente se poderão designar por “Ciências da Vida”. Noutro plano, tudo indica que a vasta maioria se identifica com situações de emprego precário que arrasta consigo uma grande incerteza de futuro.
Esta iniciativa é de algum modo contrastante com a passividade que tem sido marca dominante da comunidade científica nacional quando se trata de defender colectivamente os seus interesses profissionais, designadamente naquilo que respeita a garantia de adequadas condições de trabalho e de trabalho com direitos que permitam uma estabilidade mínima de vida em condições dignas e uma produção científica de qualidade. Defesa e garantias que, correctamente entendidas, são afinal indissociáveis do progresso geral da nossa sociedade.