Reunião do 89º Conselho Executivo da FMTC
Gif-sur-Yvette (Paris), 28-30 Abril 2019
INTRODUÇÃO
A 89ª reunião do Conselho Executivo da Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos (FMTC) teve lugar na vila de Gif-sur-Yvette, próximo de Paris, entre os dias 28 e 30 de Abril último. O Conselho Executivo (CE) — órgão estatutário que dirige a vida da Federação Mundial entre Assembleias Gerais — reúne normalmente uma vez por ano. Entretanto, em 2018, a reunião que chegou a estar prevista para Dezembro, em Orã, na Argélia, foi cancelada à última hora por razões ligadas à situação sociopolítica interna que na altura se vivia naquele país. A 88ª reunião do CE da FMTC foi assim a que teve lugar em Dezembro de 2017, em Dakar, no Senegal, no fecho da 22ª Assembleia Geral da Federação Mundial.
A reunião de Gif-sur-Yvette veio substituir a que não pôde realizar-se em Orã. Questões organizativas e de ordem financeira levaram a que fosse mais curta do que o habitual ainda que se tenha mantido no programa o Seminário que é normalmente programado como um dos pontos altos das reuniões do Conselho Executivo. O tema escolhido para o Seminário foi “Ciência, Paz e Desenvolvimento Sustentável”[1].
Numa apreciação global, é justo dizer que a reunião de Gif-sur-Yvette do Conselho Executivo da FMTC foi bem-sucedida e substancialmente útil. Apesar dos problemas financeiros e de agenda decorrentes do cancelamento in extremis da reunião de Orã, contou com 38 participantes em representação de 14 países de quatro continentes: África, Ásia, América (do Sul) e Europa. Para além do país hospedeiro, estiveram presentes, entre outros, delegados da Argélia, Brasil, China, Espanha, Marrocos, Rússia e Senegal. Duas das três organizações portuguesas filiadas na Federação Mundial marcaram presença: a ABIC e a OTC. Em representação da OTC estiveram Joana Santos, membro e Secretária da Direcção, Luís Alfaro Cardoso, antigo membro da Direcção, a convite desta[2], e Frederico Carvalho, Presidente da Direcção e vice-presidente do Conselho Executivo da FMTC.
Além dos problemas referidos, financeiros e de agenda, verificaram-se ainda, como já aconteceu em outras oportunidades, algumas dificuldades na obtenção de vistos, no caso vertente, levantadas pelas autoridades francesas em relação à delegação da República do Congo-Brazzaville. Questões deste foro tendem a ser recorrentes, embora afectando um número reduzido de participantes. Daí a proposta, que foi aprovada pelo Conselho, mandatando a Federação Mundial para agir contra a recusa de vistos a investigadores e pela possibilidade de viajar livremente por razões de trabalho científico em qualquer parte do mundo. Nesta linha, a Federação reivindicará a criação de um “passaporte científico” semelhante ao passaporte diplomático.
O 89º Conselho Executivo foi marcado pela riqueza dos debates que tiveram lugar, riqueza alimentada pela diversidade dos países representados, pela qualidade das decisões tomadas e, finalmente, pela presença reforçada de colegas mulheres com intervenção destacada nos trabalhos que decorreram ao longo dos dois dias de reunião. Duas colegas, respectivamente, da Argélia e do Senegal, foram cooptadas para integrar o Secretariado Internacional da Federação. Os trabalhos do Conselho Executivo abriram, como é norma, com o relatório do Presidente Jean-Paul Lainé.
Os trabalhos decorreram no Centro de Formação Benoît-Frachon, da Confederação Geral dos Trabalhadores francesa, principal confederação de sindicatos de França que mantém desde há muito uma relação privilegiada de parceria com a FMTC. O Centro dispõe de excelentes condições para receber e alojar visitantes.
GRUPOS DE TRABALHO: PRINCIPAIS DECISÕES APROVADAS
Uma parte muito significativa da actividade da Federação Mundial desenvolve-se no seio de três Grupos de Trabalho especializados previstos nos seus estatutos:
- Grupo 1 — “Paz, Desenvolvimento e Cooperação”;
- Grupo 2 — “Energia e Clima”
- Grupo 3 — “Condições de trabalho e Estatuto dos investigadores”
Para além destes grupos existe um grupo informal encarregado das relações de cooperação com a UNESCO. Em Gif-sur-Yvette foram lançados dois outros grupos informais, um deles sobre a situação das mulheres na ciência, outro sobre comunicação com o público.
Como sempre acontece por ocasião das reuniões do Conselho Executivo os três Grupos de Trabalho acima referidos reúnem-se separadamente para, no âmbito das respectivas áreas de intervenção, fazer um ponto de situação e elaborar propostas a levar ao Conselho que por norma incluem, propostas de decisão sobre campanhas e acções a desenvolver, propostas de estudo e acompanhamento da evolução da situação em domínios específicos, como desarmamento, transição energética ou precariedade laboral. A representação da OTC nos Grupos de Trabalho foi assegurada por Joana Santos (Grupo 3), Luís Alfaro Cardoso (Grupo 2) e Frederico Carvalho[3](Grupo 1).
Referem-se a seguir as principais propostas de decisão aprovadas por unanimidade em sessão plenária do Conselho Executivo.
No âmbito do Grupo 1:
- Aprovar e tornar pública uma tomada de posição da FMTC sobre desarmamento nuclear tendo em conta a situação geopolítica actual;
- Promover um estudo aprofundado sobre as condições económicas e sociais sistémicas que comportam riscos para a segurança colectiva;
- Acompanhar com atenção as iniciativas de organizações não-governamentais favoráveis à Paz, ao desarmamento e à segurança.
No âmbito do Grupo 2:
- A FMTC associa-se ao projecto da CGT francesa de cooperação com organizações sindicais da Ásia sobre os temas das alterações climáticas, da emergência ambiental e da transição energética justa;
- A versão curta do Apelo de Dakar dará lugar a uma petição pública no sítio change.org;
- As organizações filiadas são convidadas a promover a divulgação do Apelo de Dakar, inclusive através das redes sociais, em especial na sequência do lançamento da petição pública via Change.org acima referida. O Apelo de Dakar deve continuar a ser divulgado até à Cimeira da ONU sobre o Clima, de Setembro de 2019, e durante a Cimeira;
- Um documento de acreditação oficial da FMTC, assinado pelo Presidente, deverá ser disponibilizado às associações filiadas que o poderão usar nos contactos com entidades oficiais, locais, nacionais ou internacionais, a estabelecer com o objectivo de dar a conhecer e promover o Apelo de Dakar:
- A FMTC apoia o movimento juvenil pelo clima; entrará em contacto com os organizadores do movimento em diferentes países e apela às associações filiadas a agir no mesmo sentido.
No âmbito do Grupo 3:
- O Questionário sobre a situação da investigação científica e as condições de trabalho dos trabalhadores científicos será enviado a todas as organizações filiadas procurando recolher a informação pertinente no mais breve espaço de tempo;
- A FMTC lembrará às autoridades competentes o compromisso e a necessidade de investir pelo menos 3% do PIB nas actividades de I&DE;
- A FMTC apela à participação na Marcha pela Ciência;
- A FMTC lançará um “Observatório das Liberdades Académicas” no mundo;
- A FNTC agirá contra a recusa de vistos consulares para investigadores e pela possibilidade de deslocação fácil no mundo por razões científicas. Nesse sentido reivindica a institucionalização de um “passaporte científico” em moldes semelhantes ao passaporte diplomático:
- A FMTC lançará uma campanha para a aplicação nos diferentes países da Recomendação da UNESCO, de 2017, respeitante à Ciência e aos Investigadores Científicos.
O Conselho Executivo reunido em sessão plenária aprovou ainda as decisões seguintes de carácter geral:
- Apelo à criação de um fundo financeiro para a investigação em África e para a África (e a Humanidade);
- A FMTC prosseguirá e alargará o seu trabalho de defesa e promoção da igualdade entre mulheres e homens na investigação e procurará dar visibilidade à mulher cientista;
- A FMTC proverá um espaço de reflexão, análise e proposta relativos à relação entre investigação e empresa.
Foi ainda relevada a importância de criar novos mecanismos de comunicação com a comunidade científica e o público em geral, e de aumentar a eficácia dos canais de informação existentes. Assim foi decidido abrir uma conta Twitter e, paralelamente, rever e actualizar as listas de destinatários individuais e colectivos, a que devem ser enviados quer tomadas de posição quer outros documentos emanados da Federação, incluindo nestes últimos destinatários organizações congéneres de outros países designadamente aquelas com as quais a Federação mantém ou procura vir a manter relações de parceria ou cooperação.
O Conselho Executivo aprovou uma moção de solidariedade com a comunidade académica e científica do Brasil que vive uma situação difícil.
Contribuíram para o presente Relatório, Joana Santos, Luís Alfaro e Frederico Carvalho
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[1] Frederico Carvalho interveio no Seminário com uma comunicação intitulada “Ciência, Paz e Desenvolvimento: o Papel dos Trabalhadores Científicos na Preservação da Vida” (em francês)
[2] Como complemento ao presente relatório, chamamos a atenção para a nota do colega Luís Alfaro Cardoso que foca questões importantes a reter para abordagens futuras de aspectos não tratados ou superficialmente abordados na reunião do CE da FMTC de Gif-sur-Yvette
[3] Frederico Carvalho contribuiu para os trabalhos do Grupo 3 com o artigo intitulado “Guerra e Paz: Uma Visão Geral dos Tratados Armamentistas, Tecnologias Emergentes e Activismo Cidadão” (em inglês)