A epidemia de COVID-19 e a sua gestão pelo governo estão a ter um impacto considerável no nosso sistema de ensino superior e investigação científica. A entrada no novo ano académico 2020 anuncia-se catastrófica, com as dezenas de milhares de novos alunos no ensino superior sem que as universidades tenham os meios para os acolher. Esta situação é notoriamente o resultado de mais de dez anos de restrições ao número de postos de trabalho de docentes, engenheiros, técnicos, administrativos, operários, pessoal de biblioteca… Teria sido necessário recrutar dezenas de milhar de funcionários e construído novas instalações ao longo deste tempo; o que é ainda mais actual e urgente, agora que as condições sanitárias exigem a duplicação de anfiteatros, salas de estudo acompanhado e de trabalhos práticos! Na investigação pública, faltam os meios para permitir aos laboratórios retomar as investigações que foram suspensas durante os meses de confinamento. Na ausência de vagas para investigadores e engenheiros e técnicos, a maioria dos jovens na ciência tem como único horizonte a incerteza, na melhor das hipóteses a precarização do emprego.
É nesse contexto que o governo quer fazer passar à pressa no parlamento, desde 21 de Setembro, a Lei de Programação da investigação (LPI) elaborada antes da pandemia, cujo conteúdo é o oposto das reivindicações do pessoal, e sem tirar qualquer lição da situação actual. A COVID-19 destacou a necessidade de fortalecer o serviço público. Devem ser criadas posições estáveis (no âmbito do estatuto da função pública) para responder às necessidades do Ensino Superior e da Investigação Cientifica (ESIC).
Por que nos opomos ao projecto da LPI?
Este projecto institucionaliza a precariedade do pessoal do ESIC e põe em causa os seus estatutos, a garantia de uma investigação livre e independente. O estabelecimento de “tenure tracks” (cátedras-juniores), contratos de “pré-integração condicional”, abre a possibilidade de contornar os mecanismos nacionais de acesso à profissão de professor/investigador e de investigador. A criação de novos contratos precários, contratos de projectos científicos, fraudulentamente designados por “CDI”†, cujo fim do contrato está condicionado à duração e ao financiamento do projecto de investigação, põe seriamente em causa a contratação de pessoal permanente.
O projecto da LPI promove o financiamento da investigação através de concursos, especialmente através da ANI (Agência Nacional para a Investigação), em detrimento do financiamento permanente atribuído às unidades de investigação de que os laboratórios necessitam para cumprir as suas missões. Estimula assim a competição a todos os níveis, e direcciona e limita os temas de investigação a assuntos “promissores” e/ou considerados “rentáveis” e “valorizáveis” pelo sector privado. Uma tal lógica, em particular, fez desperdiçar 10 anos de investigação sobre os vírus do tipo coronavírus!
Em paralelo, o anúncio do orçamento de 5 mil milhões de euros em 10 anos não permite nem chegar a 1% do PIB para a investigação pública, e deixaria a investigação francesa continuar o seu lento declínio. Assim a LPI prevê 357 milhões adicionais para o orçamento de 2021, o que representa um aumento semelhante ao dos últimos anos. O esforço na programação orçamental seria esperado após as eleições presidenciais! E nenhum meio significativo está planeado para responder às necessidades urgentes do ESIC ligadas à crise sanitária.
O pessoal do ESIC, assim como os alunos, assinalaram de forma esmagadora por meio de protestos, em particular a 5 de Março, assim como de múltiplas moções, que rejeitam este projecto da LPI. Hoje, a ministra tenta, através de um protocolo de entendimento “relativo à melhoria das remunerações e das carreiras”, promulgar à força as medidas precárias previstas na LPI em “troca” de promessas de aumento de prémios amplamente individualizados.
Pedimos urgentemente recursos e posições de carreira.
Exigimos o abandono da LPI e contamos, mobilizando o pessoal do ESIC, marcar a nossa determinação em construir um grande serviço público de ensino superior e investigação científica, ao serviço de todos, com recursos humanos, materiais e financeiros garantidos e permanentes, onde a precariedade deixe de existir.
Apelamos aos colegas a reunirem-se em assembleias gerais, a juntarem-se às acções interprofissionais da entrada no novo ano lectivo por todo o território e a reunirem-se massivamente no dia 21 de Setembro em frente à Assembleia Nacional em Paris, às 14h, dia de abertura do debate da lei. |
Signatários: SNTRS-CGT, CGT FERC SUP, CGT-INRAE, SNESUP-FSU, SNEP-FSU, SNASUB-FSU, SNCS-FSU, FO-ESR, SUD RECHERCHE EPST-SOLIDAIRES, SUD EDUCATION, SOLIDAIRES ETUDIANT-E-S, UNEF, L’ALTERNATIVE, UNEF, FACS ET LABOS EN LUTTE.
*No original em francês: Loi de Programmation de la Recherche (LPR)
†CDI : Contratos de Duração Indeterminada
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OBS. O texto que aqui divulgamos é a tradução dum comunicado recente que recebemos do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Investigação Científica (SNTRS) de França, filiado, como a OTC, na Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos, com o qual mantemos relações regulares. A Direcção entende que é importante manter os nossos associados tanto quanto possível informados da situação vivida no seio da comunidade científica em países estrangeiros que nos são próximos, desde logo no plano da cultura e da organização social, mas também, neste caso, da geografia.