MESA-REDONDA OTC DE PRIMAVERA 2022

O Papel da FCT no Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia

No passado dia 31 de Março teve lugar a Mesa-Redonda de Primavera organizada pela Organização dos Trabalhadores Científicos, que tratou do papel, acção e intervenção da Fundação para a Ciência e a Tecnologia na esfera do complexo de actividades, meios humanos, materiais e financeiros, do sector da investigação, desenvolvimento e inovação nacionais, e de como essa intervenção se reflecte nas prioridades e nas escolhas que ocorrem no seio do sistema, num contexto de efectiva e persistente indefinição de políticas públicas para a ciência e a tecnologia.

Na Mesa-Redonda, coordenada por Ana Maria Silva, Universidade de Évora e OTC, intervieram, pela ordem seguinte,  quatro destacados membros da comunidade científica nacional, a saber: Ana Ferreira, José Manuel Catarino, António Gomes Martins e João Gaspar Caraça.

Na sua intervenção ― “Por uma ciência com pessoas, tempos e espaços”, Ana Ferreira, Investigadora Auxiliar do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS-NOVA) sediado na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, referiu as alterações profundas do panorama científico em Portugal no último quarto de século e os seus aspectos positivos, sublinhando embora a chaga do subfinanciamento crónico das instituições e a precarização endémica dos seus trabalhadores.Fez notar a importância de que o crescimento do investimento em ciência seja acompanhado por uma reorientação do mesmo, reorientação que reconheça o imperativo da estabilização laboral de trabalhadores, valorize a diversidade de áreas científicas e possibilite uma ciência de tempo mais longo, promotora do desenvolvimento de um pensamento crítico e de ideias disruptivas. Alertou para a necessidade de que  ao reconhecimento social da ciência corresponda o reconhecimento das pessoas que a produzem.
José Manuel Catarino, Investigador-Coordenador e Presidente do Conselho Científico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), uma das mais prestigiadas instituições nacionais de I&DE, fundada em 1946, debruçou-se na sua intervenção sobre “O papel da FCT na investigação no LNEC”. O orador apresentou as várias vertentes da  actividade multiforme do Laboratório, nas suas componentes de investigação científica, desenvolvimento tecnológico e de prestação de serviços à sociedade, referindo o facto de o suporte financeiro para essa actividade multiforme ter sido, nas décadas de 70 e 80, no essencial, assegurado pelas transferências do orçamento do estado para o LNEC, a par das receitas cobradas a clientes decorrentes da referida prestação de serviços. Acrescentou que, a partir dos anos 80, a investigação do LNEC passou a ter uma crescente componente de financiamento competitivo de agências nacionais e internacionais, na qual a FCT tem uma parte importante. Essa evolução na origem dos recursos financeiros teve consequências, explicou, na tipologia de projectos desenvolvidos, nos recursos humanos, experimentais e instalações da instituição, sugerindo que a eficácia desse modelo de financiamento poderia ser melhorada.
Interveio em seguida, António Gomes Martins, Professor Catedrático (aposentado), da Universidade de Coimbra. Na sua intervenção a que deu o título “Avaliação, investigação interdisciplinar e burocracia – “É que há distância entre intenção e gesto”, abordou a questão da forma e conteúdo do relacionamento da Fundação para Ciência e a Tecnologia com as unidades de investigação, relacionamento de que, em boa medida, depende o sucesso ou insucesso e por vezes a própria continuidade do trabalho que se pretenda desenvolver nessas unidades. Em particular, no que respeita à questão, de grande importância, da investigação interdisciplinar, referiu a distância entre o estado actual entre nós e algumas boas práticas que se imporia adoptar em seu favor. O orador sublinhou a necessidade de assentar uma política científica adequada, com financiamento adequado, servida por uma prática bem organizada, por oposição a uma pseudo política que consistiria no simples “atirar de dinheiro para cima dos problemas”, sem outra consideração, o que, naturalmente, não os resolveria.

A encerrar o ciclo de intervenções, interveio João Caraça, actualmente Consultor do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian. João Caraça foi Director da Delegação em França da Fundação entre 2012 e 2016 e, anteriormente, Director do Serviço de Ciência da Fundação, desde 1988. Na sua intervenção ― “Que Política Científica Hoje?” ― pôs em relevo a importância da existência de uma política científica que se articule com as grandes opções para o desenvolvimento da sociedade, nas suas várias vertentes, económica, social e cultutal, em moldes que permitam que o esforço científico e tecnológico esteja de acordo com os objectivos estratégicos a atingir num horizonte fixado. De outro modo, uma política de ciência não passará do enunciado de um conjunto de intenções que dificilmente poderá ser reconhecido como instrumento de progresso, verdadeiramente eficaz, da sociedade a que se destina e que, finalmente, deve suportá-lo.

Como noutras oportunidades tivemos ensejo de afirmar, a Organização dos Trabalhadores Científicos, ao promover realizações como a da Mesa-Redonda de que aqui damos conta, procura contribuir para trazer a público a necessidade dos decisores políticos apoiarem de forma consequente o trabalho científico e a comunidade científica portuguesa, criando condições para que o seu trabalho, esforço e dedicação possam dar a contribuição insubstituível que está ao seu alcance para o bem-estar e o progresso da sociedade em que se insere.

Às intervenções seguiu-se no final um espaço de debate que se prolongou por cerca de uma hora permitindo o estabelecimento de um diálogo útil entre a assistência e os oradores convidados.

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A sessão decorreu, como tem sido habitual, no Auditório Professor Adérito Sedas Nunes, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, gentilmente cedido pela Direcção deste Instituto, à qual a OTC manifesta o seu reconhecimento. A sessão foi gravada (som e vídeo) e está disponível no canal Youtube da OTC. Tratou-se, pela primeira vez no que toca à OTC, de um evento em modo híbrido permitindo a participação presencial e a distância, com recurso, neste caso, à conhecida “ferramenta” Zoom. Presencialmente ou a distância, contaram-se cerca de 40 participantes.

 

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