OS PONTEIROS DO SIMBÓLICO “RELÓGIO DO JUÍZO FINAL” — O “DOOMSDAY CLOCK” DO BOLETIM DOS CIENTISTAS ATÓMICOS — FORAM ADIANTADOS 10 SEGUNDOS
Após três anos consecutivos em que os ponteiros do “Relógio do juízo final” se mantiveram imóveis a 100 segundos da meia-noite, o Conselho de Ciência e Segurança do Boletim dos Cientistas Atómicos, anunciou em conferência de imprensa no passado dia 24 de Janeiro, ter decidido adiantar 10 segundos a hora simbolicamente indicada pelo Relógio. A avaliação do Conselho, apoiada como sempre, no parecer de um grupo de notáveis que inclui uma dezena de galardoados com o Prémio Nobel, assenta no reconhecimento que faz da vulnerabilidade do mundo a ameaças globais, designadamente: o risco da utilização de armas nucleares; as consequências das alterações climáticas, não combatidas ou, no mínimo, timidamente combatidas pelos poderes estabelecidos; a utilização perversa de certas tecnologias ditas disruptivas, em que avultam os avanços da Inteligência Artificial ou a edição genética; e também acções humanas que criam condições favoráveis ao aparecimento de novas pandemias. Estaríamos assim, simbolicamente, a 90 segundos de uma catástrofe global que poria em causa a sobrevivência da espécie humana e da vida sobre a Terra.
Vale a pena lembrar que o simbólico relógio está mais perto da hora do desastre final do que em qualquer outro momento da conjuntura mundial desde a sua criação há 75 anos. Foi em 1991, com o fim da Guerra Fria, que mais longe esteve da meia-noite: marcava então 17 minutos para a hora fatídica.
Na conferência de imprensa em que foi anunciada a nova “hora” do Relógio do Juízo Final [i], Rachel Bronson, responsável pelo Boletim dos Cientistas Atómicos, disse: “Estamos a viver uma época de perigo sem precedentes, e o Relógio do Juízo Final reflecte essa realidade. Noventa segundos é a menor distância para a meia-noite alguma vez afixada pelo Relógio e é uma decisão que os nossos especialistas não tomam de ânimo leve. O governo dos EUA, os seus aliados da OTAN e a Ucrânia dispõem de uma infinidade de canais de diálogo; exortamos os líderes a explorar todos eles por todas as formas ao seu alcance para afastar os ponteiros do relógio da hora fatídica.”
Mary Robinson, presidente do Conselho dos Seniores [ii], ex-presidente da Irlanda e ex-alta comissária da ONU para os direitos humanos, afirmou: “O Relógio do Juízo Final soa um alarme para toda a humanidade. Estamos à beira de um precipício. Mas os nossos líderes não estão a agir a uma velocidade ou a uma escala suficiente para garantir um planeta pacífico e habitável. Desde a redução das emissões de carbono e ao fortalecimento dos tratados de controlo de armas e ao investimento na preparação para vencer futuras pandemias, sabemos o que precisa ser feito. A ciência é clara, mas falta a vontade política. Isso deve mudar em 2023 se quisermos evitar uma catástrofe. Estamos a enfrentar múltiplas crises existenciais. Os nossos dirigentes precisam de reconhecer que vivemos uma situação de crise.”
Elbegdorj Tsakhia, ex-presidente da Mongólia e membro do referido Conselho, afirmou: “O nosso mundo enfrenta hoje múltiplas crises. Um traço comum permeia todos eles: falha na liderança. Precisamos de uma resposta colectiva enraizada no espírito e nos valores da Carta da ONU que possa colocar-nos de novo no caminho da coexistência pacífica e do desenvolvimento sustentável”.
Sivan Kartha, cientista sénior do Instituto Ambiental de Estocolmo, principal autor do Sexto Relatório de Avaliação do IPCC e membro do Conselho de Ciência e Segurança do Boletim dos Cientistas Atómicos, disse: “Lidar com a crise das mudanças climáticas requer confiança em instituições de governação e cooperação multilaterais. A fissura geopolítica aberta pela invasão da Ucrânia enfraqueceu a confiança entre países e a vontade global de cooperar”.
Suzet McKinney, Presidente e Directora do Departamento de Ciências da Vida, Sterling Bay, especialista em Saúde Pública e membro do Conselho de Ciência e Segurança do Boletim dos Cientistas Atómicos, considerou que “acontecimentos devastadores como a pandemia de COVID-19 não podem mais ser considerados raros — situações que ocorrem uma vez num século. No entanto, desastres induzidos por doenças podem ser evitados se os países, à volta do mundo, cooperarem em estratégias globais de saúde”.
Tradução do inglês das declarações citadas, editada, para maior clareza em português.
Edição: Frederico Carvalho. Revisão: Joana Santos.
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[i] https://thebulletin.org/2023/01/press-release-doomsday-clock-set-at-90-seconds-to-midnight/
[ii] “The Elders”, uma organização não governamental internacional de estadistas mais velhos, activistas da Paz e defensores dos direitos humanos.
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