O ESTRANHO CASO PLIASSOV E AS LIBERDADES ACADÉMICAS
A comunicação social trouxe ao conhecimento público o estranho caso do despedimento de um docente universitário que leccionava literatura, língua e cultura russas na Universidade de Coimbra há 35 anos. Dever-se-á ao docente em questão, de nome Vladimir Pliassov, a criação, em 2012, naquela universidade, do Centro de Estudos Russos, ligado à sua Faculdade de Letras. Desde então terão passado por aquele Centro, algumas centenas de formandos.
O direito à liberdade de expressão do pensamento está consagrado na Constituição da República Portuguesa. tal como postula o seu Artigo 37º: “Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações”. O número quatro do mesmo Artigo estipula que: “A todas as pessoas, singulares ou coletivas, é assegurado, em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta e de rectificação, bem como o direito a indemnização pelos danos sofridos”.
Direitos e garantias que respeitam à vida em comum na sociedade, em geral, e, naturalmente, ao relacionamento pessoal e institucional no seio da comunidade académica. Se nos debruçarmos especificamente sobre as chamadas “liberdades académicas” objecto nos nossos dias de frequentes ataques por parte dos poderes constituídos em que se incluem, como é público e patente, nos meios académicos, acções desviantes no seio dos próprios órgãos superiores de gestão das instituições de Ensino Superior, é apropriado recordar a declaração ministerial de Roma, de 25 de Maio de 2018, que procura configurar o Espaço Europeu de Ensino Superior (EHEA). Nela se afirma que, “em essência, o conceito (de liberdade académica) garante que a comunidade académica possa envolver-se em pesquisa, ensino, aprendizagem e comunicação na sociedade sem medo de represálias” (sublinhado nosso). E acrescenta: “A liberdade académica também é um elemento essencial da democracia. As sociedades não podem ser genuinamente democráticas sem honrar a liberdade académica e a autonomia institucional”.
A acção espúria de afastar um colaborador com longos anos de serviço de reconhecido mérito, a ter em conta não apenas o facto de ao longo de décadas ter desenvolvido sem impedimentos a sua actividade formativa na atrás referida área de especializção, mas ainda tomadas de posição de formandos que dela tiraram proveito, é eminentemente criticável. É-o em particular pelos moldes em que foi consumada, sem audição prévia do professor despedido que permitiria contestação das suspeitas sobre o próprio formuladas, suspeitas estranhamente veiculadas em órgãos da comunicação social e não pela via institucional como seria exigível.
O comportamento das autoridades académicas responsáveis pela decisão de afastar o Professor Vladimir Pliassov das funções que desempenhava, não abona em favor desses responsáveis tal como não abona em favor de órgãos com particular responsabilidade em assegurar justiça e transparência na motivação das acções que marcam a vida da instituição universitária, desde logo o Conselho Geral da Universidade que, tanto quanto se sabe, permanece em silênco até hoje.
25 de Maio de 2023
A Direcção