FMTC-CE98-Paris 2025

98º Conselho Executivo da Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos
Paris, 9-13 de Junho 2025
RELATÓRIO DA PRESIDÊNCIA

A ACTIVIDADE DA FMTC
Depois dos nossos mais recentes Conselhos Executivos na República Popular da China e no Reino de Marrocos, regressamos à nossa sede em Paris, precisamente quando comemoramos o 125º aniversário do nascimento do nosso fundador e primeiro presidente, Frédéric Joliot-Curie (1900-1958).
Em 2026, a Federação celebrará o seu 80º aniversário e deve organizar a sua 24ª Assembleia Geral estatutária, que, curiosamente, coincidirá com o 100º Conselho Executivo. Nessa ocasião, planeamos reunir-nos algures nas Américas, provavelmente em ligação com a reunião da CILAC 2026 [1], conforme sugerido pela UNESCO, a fim de beneficiarmos do seu apoio.
No último ano, tiveram lugar várias actividades importantes. Imediatamente após o nosso último CE, o Simpósio sobre Ciência Aberta nos Países Árabes, realizado em Rabat, revelou-se um sucesso, com a participação de representantes de quase todas as nações relevantes. Estamos mesmo a considerar uma segunda edição. O nosso Secretariado Internacional tem reunido regularmente na primeira segunda-feira de cada mês, enquanto o Bureau, que prepara as reuniões e analisa as decisões, se reúne pelo menos duas vezes por mês.
Reforçámos os nossos contactos com a UNESCO, incluindo reuniões em Fevereiro com Ana Persic e Sabrina Colombo. O nosso sector de Comunicação tem feito esforços louváveis para manter o site actualizado e enriquecer o nosso conteúdo nas redes sociais. Recomendo que vejam o vídeo sobre a poluição por plásticos e o impressionante resumo do projecto de hidrologia em África, uma iniciativa de grande sucesso da FMTC em parceria com a UNESCO. Devemos também destacar a nossa colaboração contínua com a revista da UNESCO. Graças a André Jaeglé e à equipa da UNESCO, celebrámos acordos de cooperação com duas organizações do Chade, cujos detalhes serão apresentados na segunda sessão deste Conselho Executivo.
Em Fevereiro, reunimo-nos com representantes de todas as organizações francesas filiadas: Agathe Le Berder (UGICT), Anne Roger, Michel Maric, Patrick Boumier, Claudine Gallina (SNESUP-SNTRS) e Boris Gralak (SNCS). A SNCS suspendeu a sua participação, embora deseje manter a sua relação com a FMTC como observadora. Alguns de nós participaram também na conferência de dois dias da UNESCO sobre Diplomacia Científica, presidida por Lídia Brito [2].
Prosseguindo o nosso envolvimento com organizações filiadas, Jean-Paul Lainé, co-Presidente, participou no 15º Congresso da FENPROF, em Lisboa, enquanto Jamal Sebbani, Secretário-Geral, participou no congresso da SNESUP, em Angers. O nosso apelo à paz foi finalmente lançado, juntamente com o nosso apoio à iniciativa “Stand up for Science”.
A maioria dos grupos de trabalho está activa, excepto os GT4, GT5 e GT8, que necessitam de ser reactivados. O GT7 também está a progredir e apresentará aqui o seu trabalho e planos. Foi recentemente criada uma nova lista de Membros Individuais, num esforço para os envolver mais activamente nas actividades da Federação e na actividade dos Grupos de Trabalho. Notavelmente, o GT6 elaborou um Regulamento Interno revisto, a ser discutido durante este Conselho Executivo, juntamente com possíveis alterações aos Estatutos.
É com satisfação que damos as boas-vindas a uma nova organização filiada: a Associação de Mulheres Cientistas da Costa do Marfim, representada por Scherezade Fatou, que apresentará a sua associação na sessão 4. Saudamos também a presença de Gülez Evrim, da União dos Trabalhadores da Educação e da Ciência (EGITIM-SEM), da Turquia, como observadora.
Finalmente, devemos voltar-nos para a difícil situação financeira da Federação e determinar o rumo de acção para o futuro próximo.

PERSPECTIVA ACTUAL
Como tenho vindo a sublinhar nos últimos anos, os objectivos da FMTC são mais relevantes do que nunca. Na sua origem, o desafio central era a própria existência de armas nucleares. Felizmente, o progresso da ciência e da tecnologia, apoiado por governos progressistas, levou a melhorias significativas na qualidade de vida — primeiramente na Europa e nas Américas e, mais tarde, na Ásia. A África, no entanto, foi a que menos beneficiou destes avanços.

O progresso alcançado até finais do século XX levantou novos problemas, agora considerados no quadro dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da UNESCO. Eliminar a guerra deveria ter sido um dos objectivos definidores do século XXI. As guerras nunca devem ser uma opção: os seus resultados são invariavelmente catastróficos, especialmente tendo em conta as tecnologias destrutivas actuais. As propostas de declaração apresentadas pelos Grupos de Trabalho1, 2 e 3 realçam os riscos representados pelo enorme poder destrutivo detido pelos exércitos de todo o mundo. A inteligência artificial, os ataques cibernéticos e as novas gerações de drones — como enxames que se assemelham a nuvens de insectos — são inovações contra as quais ninguém pode estar totalmente protegido. Como demonstraram acontecimentos recentes, até os bombardeiros estratégicos nas profundezas da Sibéria podem ser destruídos por drones.
O conflito em curso na Palestina é um caso de completa irracionalidade, e creio que todos partilhamos a responsabilidade por não o conseguirmos impedir. Um povo que suportou o Holocausto está agora a infligir fome e sofrimento a outro. Faltam-me as palavras. Para além das guerras na Ucrânia e na Palestina, muitos outros conflitos continuam activos — Sudão, Síria, República Democrática do Congo, Myanmar, Mali, Haiti e outros. Cada um deles drena recursos de que a humanidade necessita urgentemente para enfrentar as alterações climáticas, que acredito serem o nosso maior desafio hoje.
Uma população mundial que se aproxima dos 10 mil milhões, consumindo recursos a taxas exponenciais, está a esgotar as reservas do planeta e a desestabilizar a biosfera. Devem recordar-se da conferência de Mariano Marzo, em Barcelona, sobre o Antropoceno: antigamente falávamos da poluição e do buraco na camada de ozono, mas agora enfrentamos o degelo dos glaciares e do permafrost, as alterações na distribuição das espécies, o colapso da biodiversidade, os eventos climáticos extremos mais frequentes, as secas e inundações cada vez mais intensas, os furacões cada vez mais poderosos e uma temperatura média global já 1,7 °C mais elevada do que anteriormente.
Estas questões serão abordadas com mais detalhe na palestra inaugural de Antonio Turiel no Simpósio de quinta-feira e durante as Mesas Redondas do Simpósio. Não só os combustíveis fósseis (petróleo, gás natural, gasóleo) já estão em declínio — comprometendo a indústria, os transportes e a agricultura — como 14 elementos-chave da tabela periódica estão a tornar-se escassos, incluindo cobre, prata e urânio. Os reactores nucleares estão agora a recorrer ao urânio proveniente de stocks militares.
A sensibilização para a crise está a espalhar-se (um sucesso da comunidade científica), mesmo entre os relutantes. No entanto, a escala total do risco é ainda subestimada. Como relata o GT2 (Marc Delepouve, Xiqiu Han e Josette Rome-Chastanet), inúmeros efeitos ocultos e potencialmente catastróficos permanecem mal compreendidos — como incêndios subterrâneos na Sibéria, interrupções na circulação oceânica ou a libertação de clatratos de metano do fundo do mar.
Este é o diagnóstico científico da nossa situação actual. A não ser que mudemos fundamentalmente as regras da nossa civilização — desde a vida doméstica quotidiana às estratégias dos governos e das empresas —, estamos a caminho de um aumento de temperatura de 3 °C até 2060. As consequências catastróficas estão descritas em “Mais 3 graus” (“3 Degrees More”) (Springer, acesso aberto), que promovemos no nosso website. Vastas regiões em latitudes mais baixas e áreas costeiras tornar-se-ão inabitáveis. O risco de um levantamento revolucionário é real.
Vários cenários se colocam à nossa frente. O melhor deles — a cooperação global contra a crise do Antropoceno — está quase fora de alcance. O resultado mais provável são acções menores e descoordenadas, implementadas apenas em resposta a eventos catastróficos.
Porquê? Devido a uma cadeia de decisões erradas. O capitalismo tem-se mostrado eficiente na geração de riqueza e no crescimento rápido, mas à custa da equidade e da justiça. A mudança necessária não foi feita, e os ricos continuam a dar prioridade à sua própria sobrevivência, sem compreenderem que o isolamento é impossível numa crise planetária. Para manter o controlo, os decisores apoderaram-se dos meios de comunicação de massa e manipularam a opinião pública. Como resultado, muitos jovens seguem falsos profetas que oferecem soluções absurdas. Exemplos incluem a diabolização da imigração e da tributação. No entanto, a imigração aumenta a força de trabalho e a produtividade, enquanto a tributação garante a equidade ao sustentar serviços públicos como a saúde e a educação. Sem eles, apenas seriam acessíveis aos ricos.
Estamos no caminho errado quando nos deixamos enganar pelo discurso populista, quando minamos organizações internacionais como a OMS, quando damos prioridade à competição em detrimento da cooperação e — o que é mais perigoso — quando aumentamos as despesas militares. Talvez os governos estejam a preparar-se para a “revolução climática”, que pode já estar a começar, como sugeriram os protestos em Los Angeles há poucos dias.
O papel da Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos e das suas Organizações filiadas é o de sensibilizar para os profundos desafios que enfrentamos — climáticos, sociais e políticos — e transmitir informações fiáveis e baseadas em factos para combater o populismo e a desinformação. A ciência é frequentemente desacreditada por reflectir a realidade, enquanto as notícias falsas manipulam e enganam, enfraquecendo, em última análise, a democracia.
A única forma de avançar é garantir que a maioria da população compreende a verdadeira situação e obriga os decisores a agir em prol do interesse comum. A Terra é a nossa única nave, e o Grande Dilúvio já começou.

Elies Molins
10 de Junho de 2025

(texto original editado para maior clareza)

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Artigo na página institucional da FMTS-WFSW:
EN: https://fmts-wfsw.org/2025/10/presidence-report-98th-ec-wfsw/?lang=en
FR : https://fmts-wfsw.org/2025/10/compte-rendu-de-la-presidence-98e-ce-fmts/
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[1] NOTA OTC: O CILAC-Fórum Aberto de Ciência da América Latina e Caraíbas, considerado como polo regional de ciência, tecnologia e inovação, é uma plataforma para debater, planear e monitorizar políticas eficazes com vista a atingir os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030. É organizado de dois em dois anos, de forma itinerante, em diferentes cidades da região. Ao mesmo tempo, procura consolidar-se como uma plataforma para definir posições comuns em torno de uma agenda científica, tecnológica e de inovação para o desenvolvimento sustentável e levar a voz da região ao âmbito global do Fórum Mundial da Ciência (https://worldscienceforum.org/contents/history-of-world-science-forum-110010 ).

[2] Lídia Brito, moçambicana, doutorada em Engenharia Florestal, é, desde 2022, Directora Regional da UNESCO para a África Austral, com sede em Harare.