A “Recomendação sobre o estatuto dos investigadores científicos”, aprovada em 1974 pela 18ª Conferência Geral da UNESCO, foi o culminar de uma acção desenvolvida ao longo de várias décadas pelas associações de trabalhadores científicos, representadas pela FMTC—Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos. São marcos nessa campanha a publicação em 1949, da Carta dos Trabalhadores Científicos — preparada no essencial por Frédéric Joliot-Curie e John Desmond Bernal — e a aprovação em 1969, da Declaração dos Direitos dos Trabalhadores Científicos. A FMTC, como organização não-governamental filiada na UNESCO, teve um papel de relevo na preparação da Recomendação aprovada pela 18ª Conferência.
Um dos problemas centrais da actividade científica é a integração do trabalho científico no trabalho da sociedade, problema tanto mais agudo quanto a actividade científica é um dos domínios com maiores repercussões políticas, económicas e sociais, à escala nacional e internacional. A responsabilidade social daí decorrente implica uma clara definição dos deveres dos trabalhadores científicos, perante a sua própria comunidade mas fundamentalmente perante os seus povos, e implica ainda a justa contrapartida da definição e defesa dos seus direitos.
A necessidade de um estatuto dos investigadores científicos, a que deve seguir-se o dos trabalhadores científicos em geral, provem ainda das profundas alterações, qualitativas e quantitativas, sofridas nos últimos decénios pelas profissões científicas, tanto no que se refere ao desenvolvimento da ciência como às próprias características do trabalho, à política científica, à profissionalização, à dependência dos poderes públicos e do poder económico, etc.
O documento, aprovado quase por unanimidade, não pode deixar de ser o produto de compromissos. No entanto, não deixaram de ser salvaguardados aspectos positivos fundamentais, como uma satisfatória definição dos direitos dos investigadores científicos e a obrigatoriedade do apoio, por parte dos estados, às suas organizações representativas, que devem ser ouvidas em tudo o que respeita à política cientifica nacional.
Os estados membros signatários, entre os quais Portugal, comprometeram-se a relatar à UNESCO as medidas adoptadas, no sentido da aplicação prática da recomendação.
Ao divulgar o documento entre os trabalhadores científicos portugueses, correspondendo aliás ao pedido formulado pela Federação Mundial, o objectivo da OTC era o de contribuir para que a Recomendação não fosse, como tantos outros documentos internacionais, letra morta nunca concretizada. Aos trabalhadores científicos cabe, então como hoje, a tarefa de impedir que assim aconteça.
(Adaptado do texto de abertura do número especial, publicado em Novembro de 1976, do “Boletim” da então recém-criada Organização dos Trabalhadores Científicos)
UNESCO General Conference
Eighteenth Session Paris, 17 October to 23 November 1974